Genesio Pegoraro, presidente da Acic (Associação Comercial e Industrial de Cascavel)
A sociedade brasileira e as suas entidades
representativas, principalmente as que compõem o setor produtivo, acompanham
com preocupação as movimentações da equipe de transição, em Brasília, em torno
da apreciação e possível aprovação da PEC do furo.
Articulada nos “porões” e apagar das luzes do
mandato, violando as leis de responsabilidade fiscal, sem diálogo democrático
com a sociedade e entidades afetadas, a “toque de caixa” por razões outras que
não o interesse público, a PEC da Transição gera risco à estabilidade
econômica e ao desenvolvimento social. Buscam obter um “cheque em branco”,
desrespeitando a necessidade de diálogo com os brasileiros e atropelando o
direito de novos congressistas decidir e fiscalizar sobre os programas e gestão
orçamentária do próximo quatriênio.
Além de uma irresponsabilidade que revela
descompromisso dos atuais mandatários com o futuro do País, vemos com repúdio a
tentativa de impor um “tratoraço” antidemocrático, prejudicial à economia
pública que gerará instabilidade econômica e social num contexto em que a boa-fé
recomenda o inverso: maior responsabilidade, redução de gastos e construção
dialogada com a população de um novo modelo de programas sociais com investimentos
nos quais a fome seja superada, em
definitivo, por meio da geração de empregos e renda digna à população
carente.
Quem pagará a conta? Certamente o trabalhador, os
empreendedores que fazem seu dever de casa diante do mal exemplo dos
congressistas. O momento exige transparência e maior debate para corrigir esse
modelo de poucos decidirem ou prejudicarem o destino de todos nós.
Há vários argumentos que precisam ser considerados
e que me levam, enquanto cidadão e presidente da Acic, a ser contrário aos
interesses que movimentam a capital federal neste momento. Além de elevar a já pesada
carga tributária, a PEC trará desequilíbrio fiscal, uma irresponsabilidade que
gera pobreza e piora consideravelmente a distribuição de renda no País.
É importante frisar que o equilíbrio fiscal é um
direito fundamental porque mira o desenvolvimento econômico, condição comum
entre os países nos quais os indicadores são mais justos e o bem-estar social compartilhado
de forma ampla. O amparo ao mais necessitado deve acontecer sim, mas exige-se,
para isso, responsabilidade planejamento e construção coletiva: governo,
sociedade, empresários, setor produtivo e universidades.
Bolsas e auxílios sociais devem ser instrumentos
temporários enquanto perdura a vulnerabilidade e não permanentes, sem estímulo
ou horizonte emancipador, que só acontece por meio do trabalho e qualificação.
O que precisa ser definitivo são as políticas de incentivo ao crescimento
econômico, ao fortalecimento das empresas e à geração de emprego e renda. Precisamos
estar atentos ao apagão de mão de obra que tal modelo produz. Programas
sociais sem estímulo e critérios para o beneficiado superar sua necessidade e
dependência do auxílio podem desestimular ainda mais algumas pessoas em buscar
ocupação no mercado. E sabe-se que é o trabalho que gera liberdade econômica.
Precisamos de um amplo debate de melhoria dos
programas sociais para alcançar resultados emancipatórios. Trabalho e
condições apropriadas de vida garantem dignidade humana e o tão almejado
crescimento com qualidade. Grandes especialistas afirmam que o trabalho, que
remunera o esforço e o talento, são os maiores provedores de paz social que
existem.
É fundamental lembrar que o mundo, e o Brasil,
ainda se recupera da mais grave crise sanitária dos últimos cem anos e dos
efeitos da guerra de quase dez meses, entre Rússia e Ucrânia, que agravam a
crise econômica mundial, e suas proporções finais são desconhecidas. Por isso,
os governos precisam estar vigilantes e praticar o controle fiscal para
preservar a estabilidade econômica e o amparo do seu povo.
Do ponto de vista jurídico, a PEC da Transição
viola o princípio da responsabilidade e do equilíbrio fiscal, como pontua a
Lei Complementar 101/00. Precisamos questionar também sobre os reais interesses
que movem a aprovação dessa Proposta de Emenda Constitucional de forma tão
rápida e sem o necessário debate. Não há como admitir que esse projeto seja
democrático se os atuais congressistas estão impondo o texto a “porta
fechadas”.
Não há nenhum diálogo e respeito com a opinião da
sociedade e muito menos dos parlamentares eleitos em 2 de outubro e que
comporão, a partir de janeiro, o novo Congresso brasileiro. Diga-se que essa
conduta, de aprovar uma PEC tão impactante, no afogadilho e sem transparência,
é vedada em lei, além de demonstrar quem se preocupa com o país ou com outros
interesses, que não o público.
Gostaria de apelar para a sensibilidade dos
senhores congressistas, de entender que a PEC da Transição não se justifica,
motivando maior debate sob pena de quem a apoiar ser responsabilizado quando a
“conta” chegar. Se não agirmos com responsabilidade e serenidade, caros
parlamentares, o Brasil poderá seguir em uma direção pouco favorável, capaz
inclusive de comprometer seriamente o seu futuro e de deixar como herança um país
cheio de problemas e desafios às novas gerações.